sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
O último apito - l
Andar de trem na exuberante serra de Cachoeiras de Macacu era impressionante, umbaúbas prateadas refletiam a luz da lua, quaresmas floridas davam um toque frugal às matizes verdes da paisagem e águas cristalinas corriam a procura do Macacu, sem falar do visual, que só pela ótica dos trilhos era possível vislumbrar.
Mesmo com o tempo encoberto estar sentado na poltrona verde da primeira classe, ou no desconfortável banco de madeira da segunda, não era menos emocionante; sob cerração sentia-se até um “frescor” londrino. Passageiros daquela época ficavam apreensivos com a proximidade da “curva do leão”, perto de Teodoro de Oliveira e não era pra menos, a 107 em condição de “escoteira” deu seu último apito, quando sozinha despencou no abismo, dizem que o maquinista abandonou o posto. Foi resgatada algum tempo depois. A 106 não teve melhor sorte: descontrolada, mergulhou no mesmo lugar. No Valério um vagão, que transportavam cimento caiu e desapareceu, misteriosamente, em suas águas.
Há quem diga que a explosão de uma caldeira na estação de Boca do Mato ressoou como um pavoroso estrondo por entre as montanhas e que duas mulheres foram surpreendidas no meio da ponte do rio Pomba, pelo trem conduzido por Manduca, um maquinista vindo de Registro. Uma se jogou no precipício e a outra teve as mãos decepadas, tentando segurar-se nos trilhos de bitola estreita antes de cair.
Acidentes acontecem até com os transportes mais seguros e não seria diferente com o trem. O pior que se tem notícia no Brasil aconteceu em Aracaju (SE), com 185 mortos na década de 40, por descarrilamento em velocidade excessiva. No mundo, é sem dúvida o de Peralyia, no Sri Lanka em 2004, com 1700 vítimas após um terremoto seguido de tsunami, superando o de Bihar na Índia onde 800 pessoas morreram quando uma composição desceu duma ponte para não atropelar uma vaca. O primeiro sistema a operar na serra cachoeirense - trazido pelos engenheiros ingleses - veio dos Alpes, região fronteiriça entre França e Itália. Era utilizado para transpor o monte Cenis, aquele que Carlos Magno atravessou com seu exército no ano de 773 para invadir a Lombardia. Suas locomotivas empurravam os vagões, por isso não tinham farol. Ouvi dizer que os britânicos sentavam no panorâmico vagão da frente, pitando seus fedorentos cachimbos serra acima. Estas máquinas foram substituídas a partir de 1883 pelas também inglesas “Baldwin” de aderência total, da North British e operavam com uma distinta função relacionada à frenagem, dezenas de toneladas comprimiam o terceiro trilho, evitando assim a patinagem. Nestas máquinas, o trilho guia funcionava também como um freio adicional.
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