quarta-feira, 4 de junho de 2025

Perfume de sangue

Perfume de Sangue

Desde os primeiros passos humanos, convivemos com um inimigo discreto, quase invisível, que nos fareja com maestria ancestral. 
Os mosquitos ceifam vidas em silêncio, matando mais do que as guerras. Um milhão de mortos anualmente. Cinquenta bilhões ao longo da história humana. Parece uma maldição biológica que acompanha a humanidade.
Muito antes de nós, Homo sapiens, os Homo erectus já eram farejados por esse minúsculo assassino. No âmbar do Líbano, repousam fósseis de 130 milhões de anos no período Cretácico. Interessante é que são machos hematófagos que, atraídos pelo perfume das árvores, ficaram eternizados na resina.
Eles nos escolhem pela cor da roupa, pelo calor do corpo, pelo bailar invisível do dióxido de carbono que exalamos ao expirar. Se deliciam com o ácido lático do nosso suor e não resistem a certos aromas da pele. Possuem células nasais que decifram fragrâncias com precisão mortal.
Só as fêmeas do Aedes sugam sangue, buscando suas vítimas ao amanhecer e ao entardecer. Ficam mais ativas na lua cheia, parecendo pequenas vampiras.
Nossa pele exala uma substância conhecida como "decanal", é derivada do ácido sapiênico, um perfume exclusivo da pele humana, que para elas é irresistível.
 Talvez um dia possamos usar esse aroma como isca, desviando-as de nós. Quem sabe silenciar seu olfato afiado, desligar seu “GPS químico” e, assim, conter as terríveis zoonoses que os mosquitos espalham pelo mundo.
Enquanto isso, seguimos exalando o perfume que elas adoram e, pontuais e precisas, vêm buscar nosso sangue para maturar seus ovos.
Ronaldo Rocha - Médico Veterinário UFRRJ/ Jornalista ABJ

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