domingo, 31 de agosto de 2025

O adeus dos Vagalumes

O adeus dos Vagalumes Dizem que os vagalumes não são apenas insetos. São fragmentos de estrelas que se perderam do céu. Centelhas de anjos que resolveram viver entre nós, lembrando que a escuridão também tem alma. Quando criança, morei no Ganguri de Cima, na Rua da Linguinha, na atual Antônio Pinto — não me perguntem o porquê do nome da rua. Saiam em bandos assim que o céu começava apagar. Soltando seus lampejos na flagrância do campo de lírios. Seres luminosos, brincando no ar como monges em procissão. Riscando enviesado, a escuridão em cintilante ebulição. Naquele tempo, eu acreditava que o escuro respirava, e que no âmago do ébano a luz clareava. Mas a despedida começou cedo. Andam sumidos da beira do rio e sua luz, no pasto, cada vez mais se apaga. Espantados pelo clarão das lâmpadas. Feridos pela artificialidade dos agrotóxicos que maculam a terra. Afugentados das cidades que nunca dormem, onde o silêncio e o mistério da noite não têm mais lugar. Os luzicus , como também são conhecidos, recolhem seu brilho. Porque os homens, acostumados ao ruído; já não sabem rezar junto com o breu. Perdeu a capacidade de ver no escuro — metaforicamente: de ter fé, intuição e poesia. E assim nasceu o êxodo das luzes aladas. Uns dizem que se mudaram para vales onde a noite ainda é verdadeira. Outros acreditam que voltaram ao céu, recusando-se a iluminar corações que se olvidaram da esperança. E a noite — sem os monges brilhantes e sem a coreografia luminosa, órfã ficou. Não sei se eram só insetos. Talvez fossem mensageiros, guardadores de um segredo que não aprendemos a escutar. Talvez o mundo tenha deixado de merecer sua reluzência. Quando o último pirilampo partir, não será apenas mais uma espécie a extinguir. Será também a bênção de acreditar que a noite é sagrada. E talvez só então entenderemos, embora tarde; que os "coleópteros" e sua bioluminescência eram os últimos lampejos que aceitaram habitar conosco

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